O QUE SIGNIFICA MAYA?
Assis Ribeiro (Sociedade Teosófica)
O conceito
de Maya é outra das expressões importadas das filosofias
hindus e transladadas diretamente do sânscrito, tendo sido incorporada ao
vernáculo de forma açodada e superficial.
Tal como o
conceito de Dharma, Maya comporta uma série de
sutilizações de significado e está longe de ser somente “ilusão”, como imaginam
alguns desavisados.
Maya é, de fato, o princípio causador da ilusão por via indireta, mas
não é a ilusão em si mesma.
O que é
ilusório não são as coisas em si mesmas. A ilusão está em nossa incapacidade de
perceber as coisas como são em seu próprio nível de realidade. Nós as vemos de
forma distorcida, de acordo com nossas limitações sensoriais e nossos
condicionamentos. Isso não significa que as coisas “não existam”, e sim que não
podemos percebê-las como são em si mesmas.
Nossas
percepções são coloridas e distorcidas por nossos sentidos. Esse fenômeno de
distorção de nossa percepção objetiva é, sem dúvida, ilusório. Maya,
porém, é mais do que isso. È a propriedade de plasmação de formas, sons,
imagens e ritmos que formam o mundo natural.
Maya é o
princípio de polaridade feminina, que torna a Natureza uma artífice de
criatividade sem limites. É o próprio poder criador se manifestando em miríades
de imagens, que se modificam em perpétuo movimento (Krya Shakti).
Lançando mão
da metáfora do Shivaísmo hindu, Maya é a dança da Skakti em
torno de Shiva, produzindo um movimento contínuo e envolvente, que dá origem a
todo o movimento cósmico.
Poderíamos
também usar a metáfora egípcia e compreender Maya como os Véus de Ísis, a deusa
consorte de Osíris.
Os véus de
Ísis simbolizam a roupagem externa da natureza, que oculta o segredo dos
segredos: a essência última que existe no âmago da realidade e só se pode
manifestar através dos “véus” que representam a face exterior da natureza.
Por um lado Maya é
o poder criador da Natureza. Por outro, é a ilusão causada pela mente humana,
que percebe essas manifestações, enxergando-as como a mente é, e
não como as coisas são em si mesmas.
Não sabemos
como as coisas são em si mesmas, porque não podemos perceber as coisas em si.
Tudo o que percebemos (cores, sons, formas, sensações) são vibrações
provenientes dos objetos, captadas por nossos sentidos e formatadas pelo
cérebro de acordo com os efeitos neurológicos causados por essas imagens. Somos
conscientes apenas dessas imagens e não dos objetos representados por elas.
Vivemos em um mundo de imagens e consideramos reais essas imagens projetadas, a
partir de algumas vibrações que recebemos dos objetos.
Assim,
podemos considerar toda a matéria e toda a energia do universo como o poder
exteriorizado (Shakti) de uma consciência. Não da nossa consciência em
particular, mas da consciência suprema da qual somos uma pequena parcela, um
ponto focal.
Por sermos,
em nosso ser essencial mais íntimo, partes integrantes e inseparáveis de uma
consciência única, estamos ligados por elos invisíveis com tudo o que existe,
inclusive com a própria matéria. A matéria é a projeção exterior da consciência
única e absoluta, sendo que essa projeção nos faz sentir enganosamente que
estamos separados dos outros seres e dos objetos. Tudo está contido dentro da
consciência.
Maya ou a Shakti é o poder exteriorizado e manifesto, enquanto Shiva é o
centro imanente ou emanador deste poder. Por essa razão, nas imagens de
tantrismo, Shakti é quem dança em torno de Shiva estático.
Da mesma
forma, na teogonia egípcia, é Ísis que dança em torno de Osíris, balançando
suas verdes asas sobre o deus morto e restituindo a vida ao “grande apático”
Não caiamos
no erro do positivista que, para retrucar o argumento de um niilista que dizia
ser tudo uma ilusão, chutou-lhe a canela e gritou: “Isso não vai doer! É o
chute ilusório de um pé ilusório numa canela ilusória!”
É claro que
algo aconteceu ali. Diferentes coisas interagiram e produziram um resultado.
A ilusão não
está no fato em si nem nos aglomerados de matéria que produziram esses efeitos.
Está na maneira com que esses eventos foram registrados pela consciência dos
participantes.Maya é um atributo criativo do aspecto feminino da divindade: são os véus de Ísis que nenhum mortal poderia erguer, porque seria necessário que um homem se elevasse acima de sua condição de mero mortal, para poder ver e compreender o que existe sob os véus de Ísis.
Por
isso, Maya é muito mais do que a ilusão dos sentidos. É o
poder formador e plasmador de todos os cenários e de todos os aspectos
“externalizados” de tudo que existe. É a capacidade infinita da mente universal
de criar imagens caleidoscópicas para o fluxo da existência. Nossa incapacidade
de decodificar essas imagens e ver sua realidade intrínseca é que faz com que
Maya pareça ser para nós a grande ilusão.
Fonte: http://www.sociedadeteosofica.org.br/bhagavad/site/livro/cap37.htm
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