O Judiciário Brasileiro e a opção preferencial pelos ricos.


Por João-Francisco Rogowski.

Jurista

 Como incorrigível idealista do século passado (XX), por mais que eu tente não consigo deixar de me emocionar todos os anos em datas como o vinte de setembro.

Para mim é sempre um dia reflexão.

A humanidade e a Igreja dormem um sono letárgico, manipuladas pela TEOLOGIA DA DOMINAÇÃO, ocupando-se com questões menores. Trata-se de uma estratégia de desviar o foco daquilo que realmente importa combater, que são os governos corruptos, o terrorismo, o crime organizado, o desbordamento ético e moral da mídia e as mega corporações que oprimem os consumidores.

Uma dessas reflexões eu fiz quando caminhava pelas ruas da cidade de Caxias do Sul, na serra gaúcha, em vinte de setembro de 2008, numa manhã de nevoeiro, peculiar a região serrana, ao ver emocionado uma tropa que passava, cavalos vistosos, bem cuidados, montados por orgulhosos cavaleiros e belas amazonas,  portando bandeiras e estandartes alusivos ao Estado do Rio Grande do Sul e à revolução farroupilha, daí nasceu o artigo “A Maçonaria e a Revolução Farroupilha”.

Neste vinte de setembro (2011) minha reflexão se estende para incluir minhas preocupações quanto à justiça e a prática de eugenia jurídica e elitização do Poder Judiciário priorizando o acesso à jurisdição àqueles que detém poder econômico.

Conforme escrevi:

“Fica cada vez mais nítido o desprezo pelos consumidores, pelas minorias e hipossuficientes e a enorme influência do poder econômico internacional no seio do judiciário brasileiro.” (A INFLUÊNCIA DO PODER ECONÔMICO INTERNACIONAL NO JUDICIÁRIO).

Entendo que isso decorre da propagação da teologia da dominação que, ao meu sentir, é fruto de uma distorcida interpretação do ensino apostólico do Apóstolo Paulo que pregava o respeito incondicional à autoridade dentro de um rígido princípio de hierarquia.

Nas cartas aos Romanos, capítulo 13, versos 1 a 3 o Apóstolo diz: “todo homem se submeta às autoridades constituídas, pois não há autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram estabelecidas por Deus. De modo que aquele que se revolta contra a autoridade, opõe-se à ordem estabelecida por Deus. E os que se opõem atrairão sobre si a condenação. Porque os magistrados não são terror para as boas obras, mas para as más. Queres tu, pois, não temer a autoridade? Faze o bem, e terás louvor dela."

Paulo disse ainda:

“Servos, obedecei, com temor e tremor, em simplicidade de coração, a vossos senhores nesta vida, como a Cristo...” (Ef 6, 5). Ele afirmava que os escravos deviam ser ‘submissos a seus senhores em todas as coisas’, pois somente assim honrarão a Deus (Cf.  Tt 2,9). Esse discurso também se estendeu às mulheres, como afirmou o Apostolo: “E o homem não foi criado para a mulher, mas a mulher para o homem” (1 Cor 11, 8-9).

Séculos depois, essas palavras forjaram uma doutrina eclesiástica para assegurar e expandir o poder do clero, sobretudo, no novo mundo, em face às descobertas de novas terras pelos navegadores europeus.

A doutrina não se restringia ao poder divino, mas também ao poder secular dos monarcas e outras autoridades servindo como uma luva para propósitos menos nobres, calcados na tirania e no desejo de opressão dos povos. 

Eu não creio que o objetivo de Paulo fosse oprimir os fracos ao pregar a obediência absoluta às autoridades. Há que se levar em consideração os aspectos culturais, sociais e políticos da época em que Apóstolo fez suas exortações em defesa de um poder absoluto. E também por ser uma época de grande perseguição aos Cristãos pelo império romano, especialmente pelo imperador Nero, um indivíduo acometido por grave demência, assim, numa época em que imperava o regime de governo monárquico absolutista, não só em Roma, mas também em Israel, os Apóstolos deviam agir com cautela e prudência para não desafiar além do necessário o sistema vigente, já que o Cristianismo por si só já era deveras revolucionário na medida em que pregava a liberdade num contexto de despotismo e absolutismo, "Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres." (João 8:23)

Naquela época respirava-se um "ar de rebelião" em todo canto, inúmeros eram os grupos e seitas organizados e armados fomentando uma insurreição contra Roma, tanto em Israel como em outras localidades.

A cúpula da Igreja sabia que o rastilho de pólvora uma vez incendiado não poderia ser parado e os Cristãos que já vinham sendo perseguidos e massacrados acabariam por serem totalmente eliminados juntamente com os rebeldes e revoltosos, morrendo também o Cristianismo.

Os ensinos de Paulo objetivaram por ordem e freio naquela situação, sabendo que somente pelo poder das idéias e não das armas a Igreja triunfaria sobre seus opositores no devido tempo.

Como sempre, homens mal intencionados se aproveitaram das idéias de Paulo em beneficio próprio com diferentes finalidades. Ainda em vida o Apóstolo percebeu isso tanto que fez sérias advertências à Igreja:

“… não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro” (Ef 4:14). Mas, ao invés, cresçamos no “conhecimento e na graça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2 Pe 3:18).

O fato é que durante o apogeu da Igreja na Idade Média a teologia da dominação se consolidou e se incrustou de tal forma no ocidente que seus reflexos ainda agora em pleno século XXI se fazem sentir através do autoritarismo que permeia todos os segmentos da administração pública, do guarda da esquina ao Presidente da República.

O Judiciário não esquiva dessa realidade, ao contrário, ele sempre foi uma ferramenta eficaz de dominação dos trabalhadores, dos camponeses, dos consumidores e outros, pelas elites brasileiras e corporações internacionais.

Basta ver que essa instituição não aceita críticas, não aceita o debate público e a discussão de suas mazelas, não presta contas de seus atos ao povo, enfim, é um ente ditatorial que destoa do Estado Democrático e quase sempre paira acima dele.

O jornalista Fernando de Barros e Silva em sua coluna no jornal Folha de São Paulo (18/09/2011), retratou muito bem o judiciário ao dizer:

“Dos três Poderes, o Judiciário é o mais opaco, o mais refratário à idéia de que deve se submeter a mecanismos de controle e exigências de transparência. A natureza deste poder cercado de pompas e formalidades favorece e serve de pretexto à atitude corporativa.

O conhecido bordão ‘decisão judicial não se discute’ é bem sintomático dessa mentalidade autoritária, segundo a qual o Judiciário não deve satisfações à opinião pública nem pode ser contestado.”

Que os ideais da Revolução Farroupilha continuem vivos e ardentes em nossos espíritos norteando o nosso pensamento crítico de modo a iluminar nossas ações em busca do ideal democrático que hamorniza com equilibro a ordem e a liberdade, a hierarquia e a justiça, para que se concretizem os objetivos fundamentais da República do Brasil pelos quais lutaram os valores irmãos Farroupilhas, a saber: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

SIRVAM NOSSAS FAÇANHAS DE MODELO A TODA TERRA !


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